sexta-feira, 9 de novembro de 2012

Ele se foi

Era um sábado cheio de calor.
No ápice da correria e de tantos afazeres, eu sabia que tinha que parar.
"Lìzia, vovô se foi". Uma parada brusca rompeu da boca do meu estômago. Em um momento em que podem passar imagens diversas, de repente, a vida não fez mais sentido. UM sentimento dadaísta me roubou o pouco do equilíbrio que restava: nada mais importa. As lágrimas não esperam nosso senso de controle. Saí desesperada. O inimaginável aconteceu, aquilo que a infância nunca nos tira, agora tinha chegado a sua vez. Meu avô se tinha ido.
Foi na quarta-feira mesmo que apertei-lhe as mãos pela última vez. Dei uma notícia boa a ele. Sem fala, mas com alguma força que lhe podia sobrar, ele apertou minhas mãos. Ficou ofegante, tentou balbuciar, a muito custo, umas poucas ou muitas palavras. E numa linguagem, que não consegui decodificar, mas compreender muito bem, disse a ele, que estava tudo bem, eu tinha entendido. É que, naquele momento,  nossos corações se falaram. Talvez as palavras jamais traduzam o que um coração sincero deseja falar a um coração agradecido. E com uma esperança inabalável, saí daquele lugar onde, simultaneamente, habitam a frieza crua de doença e a incansável luta pela vida. Eu não sabia que precisaria dessa força dias depois.
Ele se foi, num dia claro, bonito, em que o céu, num silêncio majestoso e sepulcral, não permitiu que chovesse. Ventou esse dia. Parece que tudo parou. E, pela primeira vez na vida, fui a um cemitério. Se não fosse tão triste, diria que era bonito. No ocaso esquecido de um dia que jamais imaginei que pudesse chegar, eu chorei compulsivamente. Talvez de tristeza, dor, luto. Mas, sobretudo, por saber quem ele era. Pelo seu exemplo em minha vida. E também pela confiança demasiada que depositava em sua neta tão frágil e que mal consegue selecionar dentre tantas palavras, que são o seu mundo, as melhores para defini-lo.
E por falar em palavras, dentre tantas que ele falou na vida,  a palavra que saiu de sua boca,ao se despedir desse mundo, foi aquela, que, em vida, em alguns momentos, ele se obstinou a acreditar. Meu avô, nos seus últimos suspiros, decretou seu dever cumprido na Terra, dedicando a Deus, todas as realizações. E com um sonoro AMÉM, as suas tênues funções vitais falharam, sem, contudo, acabar de vez  e nunca, com todas as qualidades e virtudes que meu avô sempre terá.
E assim, sigo os meus dias, lutando contra a dor, acreditando que minha vó ficará bem, segurando a comoção quando piso os meus pés naquela casa, e sempre..acreditando que a vontade de Deus é feita. E que ela vai além de toda a tristeza que possa haver no mundo. Além de toda a dor. Ele se foi. Mas, de uma maneira surpreendente estará aqui. A prova da vida é essa: ser atemporal. Ser visto, mais vivo do que nunca, nas atitudes, nos frutos, nos preciosos frutos que ficam.

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